Nos tempos da Boca da Mata , o finado Luiz Vargas , que foi amigo do meu sogro, José Carrion e do seu filho, meu finado esposo, gostava de "arranchar" lá em casa.
Naquele tempo só tinha mata entre a Fazenda Santa Tereza à Conceição e, quando ele ia comprar mantimentos sempre "arranchava" em casa. Ele era um homem muito gordo, pesado, comia comida que dava sustança. Ele ia montado em um cavalo e o vaqueiro dele ia puxando mais dois.
Antes de chegar nas beiras do Arraia, onde hoje é a Alacilândia , ele costumava pousar também na Fazenda dos Ferreiras, do senhor Luiz Ferreira, lá pelas bandas do Porteira , ali onde hoje é a Cachamorra , onde até hoje vive a dona Silvina, viúva de Valdemir Ferreira.
Quando um cavalo cansava, ele tinha pelo menos dois descansados, para levar o homem, para não perder tempo descansando os animais.
Uma vez ele "arranchou" em casa e, depois do almoço, quando a gente estava proseando na área de casa, ele disse: Maria, sabe o que eu tive pensando?
Eu respondi: Oxi, não sou advinha, se o senhor falar eu saberei se não falar só o senhor saberá.
Ele pausou um pouco e disse: Vou fazer uma cidade para todos nós ali na Região dos Campos , disse ele, apontando para os lados em que hoje está localizada Redenção.
Eu fiquei espantada com aquela conversa, na hora eu perguntei: Como assim, doutor? Como é que o senhor vai fazer uma cidade no meio do nada? Ali só tem campos para as tropas.
Ele olhou para mim e para o meu finado marido e disse: Tu não acredita, né Maria, acredita não, mas vou fazer.
Olhei ele de volta e disse: Acredito não, eu só acredito vendo, só vendo o senhor falar eu acredito não.
Mas vocês vão ver, disse ele de volta. Vão ver. Vão ver que vou construir uma cidade para nós. E ninguém mais precisará ir até Conceição do Araguaia para comprar mantimentos.
Depois daquele dia, todas as vezes que ele "arranchava" em casa, falava aquele negócio de construir uma cidade na Região dos Campos. Toda vez era aquela mesma conversa. E eu duvidando dele. No fundo, no fundo eu não desacreditava, mas era difícil acreditar em uma empreitada dessa.
Eu pensava que ele estava variando, que ele comia demais e variava de tanto comida pesada que comia. Eu sempre dizia isso a ele: “o senhor está é variando, a comida hoje estava pesada”.
A gente ria e ele continuava nessa história e eu brincando de desacreditar.
E não é que ele fez a cidade. Um dia saiu a notícia que ele ele tinha ido a Belém para resolver a papelada para começar a cidade.
De repente, começou a apresentar um ranchinho aqui, outro ranchinho acolá. E eu disse: uai, já tem até um ranchinho lá na região dos campos. Não demorou e já apareceu uma torre e eu dizendo: ô, já tem uma torre ali, uns ranchinhos acolá, será que vai virar cidade mesmo?
Com pouco apareceu um boteco. Meu marido já sabia que lá tinha um boteco para ele beber pinga. Não precisaria mais sair pela estrada afora em busca de uma garrafa de pinga.
Com mais um pouquinho as noticias chegavam até em casa, que tinha começado a apresentar uma farmácia naquele lugar, uma farmácia boa, ali onde hoje é o Bradesco. Ai, quando abrimos os olhos a cidade já estava apresentada.
Infelizmente o doutor Luiz Vargas não teve o prazer de ver a realização do seu sonho. Se ele tivesse vivo ele veria o tamanho da nossa cidade hoje. Infelizmente ele partiu e não viu esse sonho realizado.
Dou Graças à Deus todos os dias, pois eu vivi estas duas partes da história de nossa cidade.
Um dia eu vi duas mulheres comentando na televisão: Ah, porque nós fundamos Redenção, fomos à Belém, coisa e tal e eu pensei: “Meu Deus, quanta mentira! Meu Pai do céu! Foi o coitado do Luiz Vargas que fez tudo isso! Sofreu críticas, todo tipo de escarnio e ele acreditando no seu sonho. Toda coisa caia em cima dele e ele seguro no que acreditava”.
Uma pena que ele não está vivo para ver essa nossa Redenção. Ele acreditava, tanto acreditava que guardou o seu primeiro ranchinho, todo alinhavado em palha, pregado, bem pregado na sua casa, para mostrar a força que ele tinha e o tamanho do seu sonho.